SER PAIA EXTRAORDINÁRIA DESCOBERTA DO SIGNIFICADO DE

Momentos


O relógio não pára. As rotinas embrulham as nossas vidas num turbilhão sem fim. Quando paro, percebo. Realizo. Que a todos os momentos livres, sem obrigações profissionais ou sociais, temos de estar juntos. E estamos, estamos juntos, os três. Como a Luisa diz, “em equipa”. Porque somos uma equipa, “a Mamã, o Papá e a Bébé”. Diz ela com a sua voz fininha, mas que há muito se pretende afirmar, entre os adultos.

O relógio não pára. E as birras do dia-a-dia são cada vez maiores. Em maior número. Tudo se ultrapassa, tudo se esquece, quando ao abrir a porta de casa, a Luisa corre para os meus braços e me pergunta “Papá, o teu trabalho correu bem?”. Dois anos e 4 meses. O suficiente para discordar comigo se a torrada está boa ou se as músicas que canto possuem a letra correcta. O suficiente para me alertar que tudo aquilo que disse no mês passado não está esquecido. O suficiente para eu perceber que a Luisa é o melhor complemento que poderia ter. Os filhos são a nossa melhor e mais perfeita extensão de vida.

Vivemos, Eu e a Mãe da Luisa em função de uma educação ponderada, regrada, baseada na educação, nos valores familiares, na partilha e na felicidade. E a Luisa é feliz. É verdadeiramente uma criança com um sorriso contagiante.
Não tenho pretensões. Nunca tive. Não tenho pretensões que seja uma advogada de primeira linha, profissão essa que “herdou” do Avô materno, Avô esse que Deus colocou na sua Vida, sem laços hereditários mas com um Amor maior do que os laços de sangue obrigam. Profissão essa que escolheu, com dois anos e 4 meses, pois ela irá “defender os direitos das pessoas”. Assim me responde. Dois anos e 4 meses.
Não tenho pretensões nem o sonho de que a sua vida profissional ou escolar seja recheada de medalhas, méritos, remunerações astronômicas. Não tenho pretensões que se destaque. Não tenho pretensões que tenha um casamento burguês. Não tenho, não vivo com essa pressão. Não lhe irei colocar essa pressão.

Tenho todos os dias, bem presente e consciente, que quero para a Luisa o melhor que o Mundo lhe possa reservar. A Saúde que nenhum de nós pode controlar. A Felicidade que ninguém pode comprar ou encomendar. Quero que a Luisa seja Feliz. Que se sinta uma mulher realizada. Quero ajudar a Luisa a ser Feliz. E isso basta. Quero estar presente, poder estar presente. Abraça-la quando precisar. Largar a sua mão quando ela me pedir. Chorar de felicidade, sem que ela se aperceba. Pegar-lhe ao colo, sem limite de idade, sempre que o meu coração peça ou sempre que a ela lhe apeteça. Quero para mim, todos os momentos que a Luisa precisar, para a ajudar a crescer. Sempre presente, em todos os momentos.
Porque são os momentos, o que fazemos com eles, a melhor herança e a melhor recordação. E esses, esses o tempo não consegue apagar.


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Dois Anos de uma vez

Dois anos de uma vez só. uma reflexão. A Luisinha cresceu. Muito. Têm sido maravilhosos, todos estes dias de descoberta permanente. Entre todos estes meses, 24, a Luisa não só anda como corre. Não só fala, como conversa. Em tanta coisa que mudou, tanta outra se manteve igual. Perdeu em parte o ar “abébezado" com que nos brindava, as brincadeiras são mais propositadas, com um fim. Tudo faz mais sentido, para ela. Tirar os sapatos, para descansar os pés. Comer batatas fritas porque “é fixe”. Tudo tem que ter uma explicação. Até a escolha com quem fala ao telefone. Ou de quem gosta muito, pouco ou “mais ou menos”.
Mas a forma meiga com que conversa com o olhar, ainda me atinge como no primeiro dia em que fixou os seus pequenos olhos nos meus. Celebrar o seu 2º aniversário foi muito importante para nós, mais importante ainda celebrar o facto de podermos, eu e a mãe, vivenciar tudo isto com ela. Sem reservas. E poder mostrar-lhe que com ela e connosco esta uma família e amigos ansiosos por vê-la crescer. Essa pressa, não a tenho eu. Hoje, não sinto apenas falta de a ver ou sentir, sinto falta de toda a companhia que me faz, entre birras, amuos, choros e gritos, de quem ainda está a aprender o que verdadeiramente quer. Depois de umas férias fantásticas, onde em família desfrutamos os três (eu, a Luisa e a Mãe) de momentos incríveis, dou por mim completamente ligado ao Universo que nos liga, com ausências durante o horário de trabalho, quase que como a fazer uma pausa espiritual involuntária para pensar, lembrar, sorrir… para ela. Dias difíceis, que tantos outros passam. Desculpem, mas, nada disso muda o meu cenário. Com a idade vieram os medos. Alguns porém. As piscinas, as escadas, os parques de diversões mais arrojados, as quedas e os carrosséis, os carros elétricos e afins. Tudo faz parte do nosso Universo. É duro aceita-los. Mas forte a vontade de a ver feliz, com saúde e rodeada de pessoas que querem para ela o melhor que a vida pode reservar. E a vontade de querer descobrir, com juízo, todo esse mundo que existe lá fora, no planeta dos crescidos. O relógio não para e esta quase na hora de voltar para casa. Dou por mim a pensar que nem quando tinha 10 anos corria tanto para ver os desenhos animados. Ou 20 para ver um jogo do meu apaixonado FCPorto. Todos os dias são diferentes, todos os dias são iguais. A mesma vontade e o mesmo carinho de saber se quando eu chegar a casa, estará de sorriso à minha espera, ou… a dormir!


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Um Só


Ontem, hoje e amanhã. Bem que poderia ser o refrão de uma bonita música portuguesa. Mas neste caso, não é.

A caminho do quarto mês, sinto-me, cada dia que passa, mais próximo. Que estamos mais próximos. Que a nossa ligação tem encurtado, dia após dia. Os banhos tornam-se mais interactivos. E nem a expressão “água por todo o lado” afasta a felicidade de assistir a todo este desenvolvimento. Longe da compreensão plena das minhas palavras, as suas manifestações são cada vez mais próximas e condizentes com os meus estímulos. Os sorrisos acertados, a procura da voz, que lhe é familiar, que é também sua, por direito.

Já não quer estar sozinha. E a ausência do seu campo de visão dá direito a descontentamento. Só acontece connosco. Está tão dependente dos Pais como os Pais estão dela. Dependência boa, feliz.

Somam-se agora, a tudo isto, os milhares de saltos e palhaçadas que faço, apenas para que esboce um sorriso ou a gargalhada fácil, que tão natural lhe é, e quando o dia nasceu feliz. Passamos a profissionais da encenação, com músicas e letras aldrabadas e coreografias inventadas. Apenas para superar a importância e a côr de um qualquer brinquedo ou boneco que em nada lhe desperta a atenção.

Vivemos hoje uma nova fase, mais equilibrada entre a emoção e a razão, onde o Amor, esse, teima em não parar de aumentar.

Conversamos muito. Monólogos onde a Luisa guarda tudo o que ouve, tudo aquilo que o Pai lhe diz. Talvez para um dia me questionar da verdade e da razão do meu discurso, com o passar dos tempos.

Pela primeira vez, o choro muda de “tonalidade”. E pela primeira vez as suas lamentações são interpretadas. Acção reacção. De difícil gestão, mas com fácil compreensão.

Deixamos a Luisa na sua nova cama, sozinha, para que o sono venha por si, sem ajudas. Maior a cama, porque felizmente, não pára de crescer. Acolhedora para que o Mundo lhe continue a parecer perfeito. O quarto, esse, é o de sempre. O nosso. Onde os três, num pequeno espaço de quatro paredes, somos verdadeiramente nós, uma família. De noite ou de dia. E mudará para o dela, apenas quando estiver preparada, quando “quiser”...

Peço-lhe, vezes sem conta, que repita o som da palavra “Papá”. Que levante os braços como quem me pede um abraço. Ou que se manifeste quando sente que não estou por perto. Tenho ânsia em viver tudo com ela e sem ela, talvez tanta coisa vivida no passado já não faça tanto sentido.

Os filhos não são propriedade dos Pais. A Luisa não é minha propriedade. Mas tudo em mim está nas pequenas mãos da Luisa.
E o pacto é simples. Sem reservas ou excepções. Somos um só. Seremos um só.

E olharemos nos olhos, um do outro. Como hoje já o fazemos. Bastará isso para percebermos. Bastará isso para sabermos como estamos e o que quereremos um para o outro...


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720


720. Parei para registar. Setecentos e vinte. Estas são todas as horas que perfazem um mês. Trinta dias suficientes para a Luisinha arrebatar tudo e todos, re-calendarizar tudo e todos, conquistar o espaço de tudo e de todos. Um mês de vida conquistou ela. Um mês de vida celebramos nós.

De uma vida que é absorvida entre o dia e a noite, entre os sonos, a alimentação, as fraldas, as cólicas e as mudanças de roupa. Intervalos curtos, entre tudo isto, que nos fazem contar os segundos, que se resumem... a horas. Porque o tempo avança rápido entre tudo isto. Resta pouco, desse famigerado tempo, entre tudo isto.
Saltamos então, entre os ponteiros do tempo, para as consultas ao pediatra, as vacinas, ou um simples passeio à beira mar. Porque até ela já contou todos os poros do papel de parede que decoram o seu quarto. Mas tudo isto é fundamental e essencial para o seu desenvolvimento e é parte integrante do seu processo de crescimento. Tudo isto é fundamental e essencial e parte integrando do que é ser Mãe... e ser Pai.

720. Muita coisa mudou. Setecentos e vinte. A Luisinha já conhece a nossa voz. O nosso colo acalma o seu estado. O colo de quem também é dela, de quem também lhe pertence, onde o sono aparece rápido e o conforto não tem fim. Reage quando nos ouve, muda o sentido, o movimento do corpo. Procura algo ou alguém que lhe é familiar, muito familiar. Afinal de contas, entre tantas sombras que vê, algo parece ser dela, algo parece estar intimamente ligado a ela...
Depois, fixa o seu olhar. Tantas vezes, num silencio profundo, olhamos um para o outro. Tantas outras vezes conversei com ela como se me entendesse. Como se me estivesse a compreender. Talvez como um dia o fará.

720. Apareceu o primeiro sorriso. Setencentos e vinte. Um sorriso bom. Sempre abundante para a Mãe. Quase sempre incisivo para o Pai. Um dia ganho para todos.

De sobrolho franzido de quando em vez, agita as nossas águas. Manifesta-se, mas apenas quando acha que o deve fazer. O género, é dela.

720. Setecentos e vinte. Acena-nos porque sabe que pode. Acena-nos quando quer sentir que estamos ali, que ela está ali para nos preencher...

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Mão sobre Mão


Dia 18 de Junho de 2014. Um dia para nunca mais esquecer. Conto hoje quinze dias de profunda descoberta. Saímos dois, eu e a minha mulher, de casa, em direcção à Ordem da Lapa e regressamos cinco. O pai, a mãe, eu, a minha mulher e a Luisinha. Uma realidade de papeis, que ainda se desenham à medida que os dias encurtam e as noites se repetem.

Talvez só hoje tenha conseguido recuperar todas as emoções que se soltaram e rodearam aquela que é a maior experiência e aprendizagem de uma vida. Talvez no dia de regresso a casa tenha compreendido que a dinâmica muda. Tudo muda. O significado das rotinas ganha uma outra relevância.

A Luisinha nasceu às 15h15m. Levada, juntamente com a Mãe, subiu para o seu quarto onde viria mais tarde a conhecer o pequeno Mundo que a rodeia. Conduzia a sua cama uma senhora cuja jovialidade havera roubado o tempo, de seu nome “Felicidade”. A equipa médica, essa, estava repleta de Luísas. Apenas um enquadramento possível. Ou talvez quis a vida começar da melhor forma e dar-lhe um rumo, dar um destino ao que nos ofereceu. O seu nascimento está tão coberto de magia que faltaram as palavras, ou mesmo os pensamentos. No momento tudo foi instantâneo. Todos nós fomos sentimentos, nas horas anteriores e posteriores ao momento. Durante, tudo foi coração...

Na primeira noite, faltou-me o sono. Talvez fixei o olhar na tentativa de descrever e memorizar todos os poros que percorrem o seu corpo. Passaram-se horas e tudo estava lá, continuava lá. Para minha alegria. Menos os ponteiros do relógio que tinham pulado os números e avançado ferozmente. O descanso, nesta fase, é fundamental. Mas não tem hora marcada. Chega quando chegar a oportunidade. O primeiro banho, esse, não. Enche-nos os olhos repletos de água. As nossas mãos percorrem todo o seu corpo. A nossa massa. Como se o seu ADN soubesse que o que estava para lá da pele, também lhe pertencia.

Pertencia-lhe igualmente o sitio para onde a levamos. A nossa casa. O espaço dela. Aqui grita a coragem: estamos por nossa conta. E assim foi. E não nos temos saído nada mal, modéstia á parte.

Com o tempo caiu o elo físico mais importante. O que resta do cordão umbilical. E até este escolheu a melhor altura. Mãe e Pai. Eu e a minha mulher. Juntos. A viver mais uma etapa, sem pressa...

A mudança física da Luisinha acompanha a mudança de todo um cenário. De toda uma casa. Todos os dias surgem contrariedades. Todos os dias surge a dúvida sobre a duração e a dimensão de uma noite só. Um pai vê-se a braços com tudo isto. Julgo que sou lento de sentimentos. Forte mas lento. E com isto é construído um laço, a cada segundo que a coloco no meu colo. Um laço indestrutível. Uma fortaleza sem fim.

Ser Pai é ser parceiro no “negócio”. Descobrir que somos uma espécie de estafetas domésticos. Palmilhamos quilómetros, nas mesmas estradas, caminhos e atalhos, sempre em busca do que falta. Porque faz falta sempre alguma coisa no momento. Para nós, o importante, é que nunca falte nada. Absolutamente nada. Para elas, o importante é que estejamos sempre lá.

Ser Pai é igualmente ser mais amado. Nenhuma Mãe, com M grande como a que eu tenho em casa, resiste a um Pai extremoso, quando ele verdadeiramente o é. Revigoram-se os laços. Reforça-se o Amor entre ambos. Sinto que a vida ganhou um novo significado que nunca teve. Melhor, bastante melhor. O Amor, de Pai e Filho é forte. Muito calmo e sereno. Um Amor que não se define na literatura moderna. Talvez de lágrima fácil, mas de interrupção dificil.

Nas horas, essa medição fatal do tempo, a Luisinha insiste em que estejamos de mãos dadas. É algo pessoal. Não a contrario. Ela sente que estamos lá. E com quinze dias apenas, tem a certeza que estaremos sempre juntos...


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